(Público - Portugal) Desde que Giordano Bruno foi queimado pela Inquisição por ter falado, no século XVI, de outros sóis com planetas à volta que a humanidade se confronta com esta questão: estamos sozinhos no Universo? Na última década ficámos mais perto da resposta.
Já tínhamos aprendido que os planetas que rodeiam o Sol não são únicos no Universo, com a descoberta do primeiro planeta em órbita de outra estrela em 1995. Nos últimos dez anos percebemos que os planetas extra-solares são comuns, que há super-Terras e que, na vastidão do Universo, não há razão para outras Terras e a vida não serem comuns.
Conhecem-se mais de 500 planetas fora do nosso sistema solar. "Até 2000, descobriram-se a um ritmo relativamente baixo. A partir de meados desta década houve uma explosão: descobriram-se mais planetas, mais pequenos e mais diversos. Metade deles foi detectada nos últimos três anos", resume Nuno Santos, do Centro de Astrofísica da Universidade do Porto (CAUP).
O astrofísico de 37 anos começou a procurar planetas extra-solares pouco depois da revelação do primeiro, que tanto espantou o mundo pelas suas características. Ninguém esperava que um planeta gigante feito de gases, com metade do tamanho do monstruoso Júpiter, pudesse estar tão perto da sua estrela. Mas logo outros cientistas confirmaram a descoberta de Michel Mayor e Didier Queloz, do Observatório Astronómico de Genebra, na Suíça: a 50 anos-luz de distância da Terra, havia um gigante tão próximo da estrela Pégaso 51 que só demorava 4,2 dias a completar uma órbita à sua volta.
Desde 1998 que Nuno Santos colabora com a famosa equipa suíça e já encontrou mais de uma centena de planetas. O que aprendemos nesta década? "Aprendemos que os planetas são extremamente comuns", responde. Se inicialmente só surgiam gigantes como Júpiter e Neptuno, na última década fomo-nos aproximando de outras Terras: "Descemos o limite de detecção e encontrámos super-Terras, ou seja, planetas que têm duas a 20 vezes a massa da Terra."
A localização da primeira potencial super-Terra, em 2004, trabalho em que Nuno Santos teve um papel preponderante, foi um marco. "Esta década abriu-nos a porta para a descoberta de planetas parecidos com a Terra." Não há pois razão para não haver planetas rochosos, com o tamanho e a distância à sua estrela semelhantes ao nosso, o que os torna potencialmente habitáveis. "Os modelos teóricos previam que existissem planetas como Júpiter, Neptuno e super-Terras - e estas populações de planetas foram encontradas. Os modelos também prevêem que deve haver verdadeiras Terras - planetas de massa e composição terrestre - em grande quantidade, que estão à espera que as detectemos. Não as encontrámos ainda porque não temos capacidade tecnológica", diz Nuno Santos. "Até agora, as descobertas têm batido certo com as previsões teóricas. Podemos esperar que também se confirmem para planetas mais pequenos."
No final da próxima década, dois instrumentos deverão proporcionar um salto tecnológico, ambos com a participação do CAUP e da Faculdade de Ciências de Lisboa. Um é o Espresso, que será instalado no Chile, no maior telescópio óptico do mundo, o Very Large Telescope. O outro é o telescópio espacial Platão, da Agência Espacial Europeia, cuja construção só será decidida no final de 2011. "Em conjunto, vão ajudar a construir um catálogo de planetas potencialmente habitáveis, para outros instrumentos mais à frente irem ver se lá existe vida ou não", diz Nuno Santos.
Se a água líquida é considerada essencial para a existência de vida, noutros aspectos a vida pode ser diferente daquela que conhecemos na Terra e, para a encontrar, é preciso saber o que procurar. Em 1977, a descoberta, no Pacífico, das primeiras fontes hidrotermais do planeta, a grande profundidade, mostrou que a vida pode ser esquisita e existir onde menos se espera. A luz solar não chega ali, mas as fontes acolhem muitas formas de vida, que não dependem da fotossíntese. Na base da cadeia alimentar estão bactérias, resistentes ao calor e a um ambiente tóxico, que extraem das fontes os elementos químicos que constituem os seus nutrientes.
Este mês, o anúncio da descoberta de bactérias que gostam de arsénio, num lago na Califórnia - ainda que estes resultados estejam debaixo de fogo -, pode ser outro passo na procura de seres vivos noutros planetas. Toda a vida conhecida é construída a partir de seis elementos (hidrogénio, carbono, oxigénio, azoto, fósforo e enxofre), com os quais a molécula de ADN, as proteínas e as gorduras das células são feitas. A nova bactéria, segundo uma equipa da NASA, é capaz de substituir, no ADN, o fósforo pelo arsénio. Há quem duvide, dizendo que são precisos mais testes e que pode ser só uma adaptação a um ambiente rico em arsénio e não algo novo. Mesmo assim, é outro organismo que sobrevive em condições extremas. Todas juntas, o que significam estas descobertas? "Que possivelmente os planetas terrestres são comuns e deve haver muitos com vida, não necessariamente inteligente", diz Nuno Santos. Só agora começam pois a surgir provas científicas para as palavras que levaram Giordano Bruno, um monge dominicano, à fogueira por heresia, em 1600. Em 1584, na obra Acerca do Infinito, do Universo e dos Mundos, dizia: "Há inúmeras constelações, sóis e planetas; apenas vemos os sóis porque têm luz; os planetas permanecem invisíveis por serem pequenos e escuros. Há também inúmeras Terras a girar em torno de sóis."
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